ABIT traça planos de ações em 12 áreas e conta com comprometimento do novo presidente do Brasil
Rafael Cervone, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), afirma que o cenário do setor têxtil não está ruim. Apesar da crise global em 2008 e seus desdobramentos nocivos, os investimentos anuais cresceram de US$ 1,8 bilhão projetado para 2014. O setor aproveitou uma brecha da valorização do câmbio, para modernizar máquinas e equipamentos, majoritariamente importados.
Uma das preocupações é a forte concorrência dos países asiáticos. Se até algum tempo atrás a China amedrontava, hoje o chão de fábrica, por motivos de custos trabalhistas, se mudou para países como Vietnã, Indonésia e Paquistão, para citar três exemplos. Mas Cervone relativiza esse cenário concorrencial.
Hoje, o plano é produzir perto do mercado consumidor, diz o executivo. O que faz a diferença é que o setor têxtil brasileiro detém o know-how de toda a cadeia produtiva – da fibra ao varejo. A nova classe C não quer roupas padronizadas da Ásia, mas quer ser incluída no mundo da moda, a um preço acessível. Segundo ele, o grande trunfo do Brasil será planejar uma estratégia de produzir bens com maior valor agregado.
Precisamos transferir particularidades do nosso brand para o produto, como textura, design e cor. O que é improvável que algum outro país consiga copiar. Ele conta que certa vez, em viagem à Espanha, viu uma moça comprar um par de sandálias Havaianas por quase 200 euros. Então perguntou a ela se iria gastar tal valor naquela sandália e ela respondeu: “Claro. Com ela eu me sinto a Gisele Bündchen caminhando no calçadão de Copacabana”.
Outro fato lembrado por Cervone é do algodão naturalmente colorido, produzido na Paraíba, que tem indiscutível valor de mercado, por não exigir tinturas e processamentos. O executivo lembra ainda que o Brasil produz 60% do algodão mundial sob o selo Better Cotton Initiative, um carimbo de qualidade. Ele informa também que a ABIT está trabalhando com a Universidade de São Paulo (USP) para produzir fibra a partir de bagaço de cana, além de estarem em andamentos estudos sobre corantes naturais, como urucum.
De qualquer forma, ele cogita abertura restrita do mercado a países que têm práticas desleais nos quesitos trabalhista, previdenciário e ambiental. Por isso, a ABIT mantém constantes conversas com a Organização Internacional de Trabalho (OIT) e Organização Mundial do Comércio (OMC).
Apesar dessas expectativas róseas, Cervone salienta que o próximo presidente da República precisa se pactuar com uma série de mudanças rápidas. O instituto fez uma Agenda Fundamental para o próximo governante, que contempla 12 áreas.
No quesito relações trabalhistas, a associação propõe regulamentar a terceirização, criar um contrato de formação de 24 meses, com redução de 50% dos encargos, para empresas que admitem jovens sem experiência. “A agenda trabalhista atual é muito pesada. Enquanto o mundo caminha para a livre negociação, somos engessados”, diz o dirigente.
Na seara da segurança jurídica, entre outros pontos, a proposta inclui coordenar ações que impeçam modificações posteriores e desenvolver mecanismos legais que impeçam desconsiderações de negociações coletivas na área trabalhista. “Um exportador, por exemplo, não pode firmar um contrato de longo prazo e, em 15 dias, ser surpreendido por mudanças nas regras.” Na questão sobre macroeconomia, a Abit é favorável a independência do Banco Central, um comitê gestor que fiscalize a Lei de Responsabilidade Fiscal e a desindexação da economia, inclusive do salário mínimo.
Quando o assunto é tributação e gasto público, há a recomendação de vetar o aumento das despesas correntes em relação ao PIB, suprimir a metodologia de cálculo de “imposto sobre imposto”, baixar a zero as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para tapetes, carpetes, embalagens têxteis e glicol. A respeito de financiamento, o objetivo é estimular a expansão do mercado de capitais, promover maior acessibilidade das empresas ao financiamento para a inovação e expandir o cartão BNDES a outros países do Mercosul.
Quanto ao setor de infraestrutura, a Abit propõe reduzir o custo da energia para cadeias produtivas intensivas de mão de obra entre 22 horas e 6 horas, rever as tarifas de forma geral, melhorar a atuação das agências reguladoras e oferecer internet e telefonia equivalentes aos serviços de países desenvolvidos. Em educação, a idéia é facilitar a parceria entre empresas e universidades, ampliar os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) na qualificação profissional e favorecer parcerias entre empresas e universidades estrangeiras.
Inovação é um tema recorrente, que inclui ampliar incentivos fiscais para as iniciativas inovadoras, desenvolver um Fundo Setorial de Inovação, entre outros itens. Os temas finais referem-se a ações para o comércio exterior, preservação do meio ambiente – através de incentivos econômicos, à reciclagem e apoio à pesquisa -, desburocratização e apoio a micro e pequenas empresas.
Para Cervone, o comércio exterior precisa se expandir. Segundo ele, é fundamental que o governo firme acordos preferenciais também com grandes blocos, como União Européia, e países fortes como Estados Unidos e Japão.
A principal preocupação de Cervone são as micro e pequenas empresas. “Temos de fortalecer o elo mais frágil da cadeia têxtil, que é a de confecções. Atualmente, das 78 mil empresas do setor, 90% são muito pequenas, encaixam-se no regime do Simples. Nesse contexto, o câncer é o teto de faturamento de R$ 3,6 milhões, porque as confecções às vezes evitam crescer para não terem uma taxação mais pesada”, afirma.
Por fim, um último ponto trabalhado pela ABIT é atrair grandes redes varejistas para o País. Porém, cuidar para que a cadeia têxtil e de confecções brasileira seja a fornecedora e evitar a importação de itens do exterior.
No ano de 2013, a cadeia têxtil e de confecção produziu aproximadamente US$ 58,2 bilhões, o que equivale a 5,7% do valor total da produção da indústria brasileira de transformação, não incluídas as atividades de extração mineral e a construção civil, que complementam o setor secundário da economia.
A soma de empregos gerados pela cadeia têxtil chegou a 1,6 milhões de postos de trabalho em 2013, ou o equivalente a 16,4% do total de trabalhadores alocados na produção industrial nesse ano, bem demonstrando que, além da sua grande importância econômica, esse é um segmento de forte impacto social.
Foi analisado o período de 2009 a 2013, no qual o número de empresas em atividade na cadeia têxtil cresceu 8,9%, mas sobre 2012, houve queda de 0,2%. O segmento de confecções para a linha lar foi o que mais cresceu no período de 2009 a 2013, com alta de 11,5%. Em contrapartida, o segmento de meias e acessórios recuou 10,9%. Entretanto na confecção de vestuário, o crescimento foi de 11%, enquanto as malharias apresentaram queda de 5,9%, e as tecelagens, de 4,5%.
Quanto ao pessoal empregado na cadeia têxtil, houve queda de 3,6% no setor têxtil e de 2,7% nos confeccionados, entre 2009 e 2013. Os segmentos de confecções para a linha lar e as malharias tiveram as maiores quedas, de 12,4% e 10,6%, respectivamente. Porém, analisando o número médio de empregados por empresa, no período de 2009 a 2013, houve um declínio, tanto no setor têxtil quanto no de confeccionados. Isso significa, entre outras considerações, um maior nível de automação e modernização do setor.
Fonte: Política Industrial (Brasileiros Especiais)
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